sábado, 5 de julho de 2014

CONHEÇA A JOALHERIA CELTA

Os celtas, renomados artesãos e mestres decorativos de peças em metal, chegaram à Irlanda em torno do ano 500 aC, vindos da Europa Central através da Gália e da Bretanha , provavelmente expulsos de suas terras pela expansão da civilização romana. Devido ao frio e aos ventos cortantes da extremidade da ilha nomeada de Britannia pelos conquistadores romanos, para este povo mediterrâneo, esta região parecia um lugar impossível para a existência de vida civilizada e, portanto, foi deixada de lado. Assim, a arte celta encontrou seu refúgio por vários séculos que se seguiram e contribuiu enormemente para o desenvolvimento artístico da Irlanda.
A partir do século VI da nossa era, os broches, uma das mais importantes peças da joalheria medieval, passaram a ser mais luxuosos, decorados de forma a declarar o nível social de quem o portava. O Broche Roscrea, encontrado no Condado deTipperary, é um belo exemplo de como os joalheiros celtas adaptaram técnicas estrangeiras ao seu trabalho. As técnicas decorativas da joalheria saxônia que chegaram à Irlanda por volta do século VII, eram admiradas pela beleza do uso de gemas brilhantemente polidas, da filigrana e da gravação em metal. Ao adaptarem estas técnicas, em vez de utilizarem grandes gemas para decorar suas jóias, os celtas optaram pelo contraste simples mas elegante da decoração feita por detalhes diminutos em meio a espaços lisos: o Broche Roscrea, confeccionado em prata, é rico em detalhes como fileiras de diminutas espirais e intrincados entrelaces, contrastando com partes lisas.


Entre os séculos VII e IX, a joalheria celta na Irlanda atingiu seu ápice e a mais bela peça que representa este período é o Broche Tara. Apesar do nome, o broche não foi encontrado em Tara, local dos antigos reis irlandeses, mas foi assim nomeado por causa do seu inigualável esplendor, próprio da realeza. O broche, datado do início do século VIII, foi descoberto em uma caixa de madeira na praia de Boyne, no Condado de Meath.


Todas as técnicas de joalheria da época foram usadas em sua criação, como a gravação, a filigrana, o intaglio e a fundição. Vidro moldado, esmaltes e âmbar foram circundados e também banhados em ouro contra um reverso de prata onde figuram bestas e pássaros inspirados pela arte saxônia: filigranas e entrelaces de minúsculos grãos de metal compõem a figuras. Ao broche está presa uma corrente de prata, sugerindo a possibilidade de que fazia par com um outro broche, infelizmente nunca encontrado. Esta corrente , maravilhosamente confeccionada com milhares de anéis de prata, está fixada de cada lado do corpo do broche por duas presilhas em forma das garras de dois dragões. Entre os dragões estão duas diminutas contas de vidro, esculpidas com faces humanas. Estes detalhes individuais mostram o virtuosismo do ourives, que os utilizou para formar uma figura maior: a cabeça de uma serpente, com as contas de vidro como olhos e a corrente de prata como cauda. O verso e o anverso do broche compõem diferentes técnicas de ourivesaria e de decoração, num entrosamento perfeito. A frente do broche é refinada e sofisticada, com vidros coloridos e âmbar incrustados na filigrana, asseverando o alto status de seu portador. A parte posterior da peça é decorada com animais contorcidos que dão a impressão de se debaterem para sair das molduras que os confinam.

O Tesouro de Hochdorf



Fotos: Museu Celta de Hochdorf

Em 1977, um arqueólogo amador descobriu na Alemanha, perto da localidade de Hochdorf an der Enz, Baden- Württemberg, uma tumba celta do século 530 AC ricamente guarnecida, localizada em um sítio arqueológico de aproximadamente 60 metros de diâmetro. Logo, a tumba passou aos cuidados do arqueólogo Dirk Krausse e sua equipe, que se referiu à descoberta como um marco da arqueologia e do estudo da cultura celta. O local onde a tumba foi encontrada é chamado de “Oppidum”, palavra em latim para vila ou burgo e originalmente tinha 6 metros de altura, com a forma de uma colina.
Usando uma nova técnica de escavação, os arqueólogos foram capazes de retirar toda a câmara fúnebre de só uma vez, ao contrário da técnica antiga de retirar peça por peça. A câmara mede 12 x 15 m2 e foi retirada como um grande bloco de terra e transportado para Stuttgart. A razão para tal técnica é que os arqueólogos queriam preservar todo o material achado dentro da câmara mortuária sem correr o risco da exposição ao ar livre, o que geralmente danifica tecidos e vestimentas.
Dentro da tumba, jazia um homem com aproximadamente 40 anos e 1,87 m de altura, deitado num elegante sofá feito em bronze, ao estilo romano. Pelas ricas vestimentas e pelos objetos encontrados no corpo e ao redor dentro da tumba, o homem foi um chefe celta que viveu há 2.600 anos. No pescoço estava um torc (colar de batalha usado por várias culturas antigas, incluindo a celta) feito em placa de ouro, um bracelete no braço direito, um chapéu feito de casca de bétula, uma adaga de ferro e bronze decorada em ouro, joias em âmbar, uma navalha, um cortador de unhas, um pente, anzóis, flechas e, o mais fantástico, placas de ouro trabalhadas que decoravam seus sapatos. Aos pés do sofá, um grande caldeirão decorado com três leões. O caldeirão continha originalmente 400 litros de hidromel. Do lado oposto ao sofá de bronze, uma espécie de carroça feita em madeira com um conjunto de pratos em bronze e chifres que serviam como copos pendurados na parede, utensílios suficientes para servir nove pessoas.
A tumba do chefe celta data do último período da chamada Cultura Halstatt (640-475 AC) e que já foi objeto de artigo anterior de minha autoria. A exatidão do período de tempo foi possível por causa das joias em ouro e bronze encontradas na tumba.

Aos leitores e visitantes do blog da Nanda Semi-jóias: tenham todos uma excelente tarde!


quarta-feira, 2 de julho de 2014

Veja as principais técnicas decorativas na Joalheria através da História

Na joalheria artesanal, existem várias técnicas para decoração de joias, empregadas há centenas ou milhares de anos e ainda utilizadas hoje. Algumas delas têm seus nomes em francês, italiano ou inglês.

ESMALTAÇÃO

Técnica decorativa usada para trazer cores às joias, sem a necessidade das gemas - pode ser decoração secundária ou o foco principal da joia. O esmalte é um composto transparente vítreo colorido com a adição de óxidos metálicos. Em forma de pó, o composto é colocado em cima da superfície metálica a ser decorada e então aquecido, até que derreta e seja fixado na área escolhida. Apesar de ter um alto grau de aderência ao metal, o esmalte é uma forma de vidro e, consequentemente, propenso a rachar ou até mesmo descolar do metal se não aplicado corretamente. Geralmente, uma superfície plana esmaltada terá seu reverso também esmaltado de maneira a balancear as forças de expansão e contração produzidas no metal.

- Cloisonné (do francês cloison = célula, compartimento): técnica de esmaltação criada pelos antigos gregos na qual o desenho a ser decorado na peça de joalheria (em geral em ouro) é feito por células formadas a partir de pequenas grades, nas quais o esmalte é depositado e depois aquecido. As células podem ser niveladas à superfície metálica ou somente polidas, dando ao desenho um aspecto vítreo.


- Champlevé: técnica de esmaltação onde, em vez das células da técnica anterior, o metal é escavado (ou gravado), fazendo com que o esmalte seja depositado nas depressões e, depois de aquecido, permaneça no mesmo nível da superfície metálica. Técnica criada na Antiguidade.


- Basse-taille (baixo-relevo): Variação da técnica champlevé, onde a área escavada do metal é decorada com um design em padrão, podendo ser ele gravado ou em baixo-relevo, e depois recoberto com esmalte translúcido, assim fazendo com que o design seja visto através do composto vítreo. Técnica muito usada pelos antigos romanos.


- Plique à jour: Talvez a técnica de esmaltação mais difícil e também a mais frágil. Diminutas células recortadas na superfície metálica são preenchidas com esmalte transparente, proporcionado o mesmo efeito dos vitrais. Desenvolvida na França e na Itália durante o século XIV e muito usada por artistas durante a Renascença.


Limoges: Técnica de esmaltação que requer conhecimentos de pintura. O esmalte é reduzido a um pó finíssimo e, com um pincel, aplicado à superfície metálica. Como são usadas várias cores de esmaltes, o processo passa por vários estágios de aquecimento. Técnica criada na cidade francesa de Limoges, durante o século XII.


Grisaille: Técnica de pintura com esmalte que usa somente dois tons. O design é feito em esmalte branco sobre uma superfície metálica esmaltada em preto ou azul. Popularizada durante a Renascença, especialmente na França.


FILIGRANA

Esse delicado método de decoração de joias requer paciência e muita habilidade. Finíssimos fios de metal são dobrados, torcidos e tornados chatos: essa é a base da técnica da filigrana. Com essa base, podem ser feitas lindas decorações em joias e, até mesmo, uma peça inteiramente feita em filigrana. A melhor e mais delicada técnica de filigrana é a open-back (fundo aberto). Um dos grandes segredos da filigrana, além da paciência e da criatividade, é a solda que tem que ser feita a uma temperatura que não comprometa os designs formados pelos fios torcidos. A técnica foi criada pelos antigos etruscos e muito usada por ourives da antiga Grécia, especialmente durante o Período Helênico.


GRANULAÇÃO

Exemplos dessa técnica decorativa podem ser encontrados em muitas joias antigas, mas nenhuma delas se igualou à qualidade da granulação criada pelos etruscos (a partir do séc. VI a.C.). Na granulação etrusca, minúsculas esferas de ouro eram afixadas a uma base de metal precioso, em geral ouro, por um método que unia a solda e a fusão. Usando esta técnica, os ourives etruscos eram capazes de realizar maravilhosos e delicados designs com grande precisão.

A técnica aperfeiçoada pelos artesãos etruscos não pôde ser repetida durante 2.500 anos, apesar de várias tentativas feitas por ourives e artesãos ao longo dos séculos. Somente no séc.XIX, o joalheiro romano Fortunato Castellani e seus filhos foram os primeiros, depois de várias pesquisas em joias antigas, a conseguir repetir a técnica etrusca da granulação.


GRAVAÇÃO (baixo-relevo)

A técnica da gravação é talvez a técnica decorativa mais utilizada na joalheria, e a mais antiga, quando se trata de decoração de superfície de metais preciosos. Ainda assim, foi preciso o domínio da metalurgia do ferro, metal superior ao bronze em relação à dureza e a abundância de jazidas (as primeiras indicações de sociedades com nível cultural e tecnológico correspondente à Idade do Ferro surgiram no século XII a.C. no Oriente Próximo, na Índia, na África e na Grécia. Em outras regiões da Europa, o início da Idade do Ferro deu-se mais tarde, a partir do século VIII a.C.) para que surgissem as ferramentas necessárias para a técnica da gravação. Algumas das ferramentas mais usadas são os rolos ou cilindros para gravação: dois rolos ou cilindros de aço (inicialmente, de ferro) contendo desenhos gravados em sua superfície que, ao pressionarem simultaneamente uma fita de metal precioso deixavam nela padrões gravados, que poderiam se repetir infinitamente. Mas a ferramenta para gravação mais comum desde tempos imemoriais é o buril, que permite ao artesão uma gama extensa de possibilidades de designs gravados e, ainda, “marcar” a sua obra, já que o trabalho de gravação com buril assemelha-se ao de um calígrafo com a pena, é único e pessoal.


INTAGLIO

A técnica do intaglio pode ser feita em uma grande variedade de superfícies, incluindo as gemas e os metais preciosos, no caso da joalheria. Na Antiguidade, a técnica do intaglio era utilizada principalmente para a confecção de sinetes ou anéis com o símbolo do clã ou família. Nas gemas, esculpiam-se magníficos designs com elaborados detalhes. O intaglio era e é feito artesanalmente esculpindo-se literalmente o metal precioso ou a gema.


METAL INLAY

Através desta técnica, diferentes cores de metal precioso ou diferentes metais preciosos são “enquadrados” em uma superfície preciosa já preparada com recortes feitos pelo cinzel, ou por gravação. O Inlay pressupõe o enquadramento de metais preciosos mais macios nas cavidades de superfícies metálicas preciosas mais duras.


MOSAICO

A criação de paisagens em miniatura para decoração de joias com o emprego desta técnica existe desde o início do século XIX na Itália. A forma mais detalhada do Mosaico na joalheria é feita em Roma e é conhecida como “micro mosaicos”: a pintura é formada usando-se minúsculos tesserae (azulejos) feitos geralmente de vidro colorido, que são cimentados na peça de joalheria.

- Pietra Dura: Técnica desenvolvida em Florença, onde os tesserae são substituídos por gemas como ágata, malaquita e carneliana, que são aplicadas sobre um fundo negro. Os designs utilizados em geral são motivos florais.


NIELLO (do italiano niellatura = escurecimento)


Técnica inventada pelos antigos egípcios e espalhada pela Europa durante a Idade do Ferro, consiste na aplicação de uma liga de cor preto-esverdeada contendo prata, cobre, chumbo e enxofre, em linhas gravadas, células ou áreas escavadas na superfície metálica, que depois recebe aquecimento à baixa temperatura para aderência da liga ao metal. Depois, a superfície pode ser polida ou queimada e fica com um brilho metálico semelhante ao da gema conhecida como hematita.


PIQUÉ

Usada para decorar cascos de tartaruga primeiramente, ou chifres de animais, essa técnica insere prata, ouro ou madrepérola nas linhas abertas por designs gravados na superfície. A técnica originou-se na Itália do século XVI.


REPOUSSÉ

Consiste em formar desenhos ou padrões em uma superfície chata de metal precioso, pelo método de martelar pelo lado “avesso” da chapa de metal para delinear o desenho ou estabelecer o padão usando martelo de ourives e pinos de aço próprios para a técnica. Às vezes, nem todos os detalhes podem ser feitos pelo lado “avesso” da folha de metal, então se vira a chapa e a decoração é terminada com a complementação dos designs. Quando o método necessita desse último recurso, a ele é dado o nome de chasing (ou gravação em relevo). Desde centenas de milhares de anos, o repoussé é uma técnica que consome muito tempo, normalmente sendo usada apenas para joias significativas, sejam em tamanho ou valor.


STAMPING

A técnica consiste em criar infinitos e pequenos desenhos na cabeça de pinos de aço (anteriormente utilizava-se o ferro) que, ao serem martelados contra uma fina folha de metal precioso, formam designs. Nessa técnica o ourives também pode utilizar o método da impressão por repetição (padrões), ao criar um carimbo com determinado desenho e pressioná-lo contra a folha de metal, com a ajuda do martelo de ourives. Ainda pode criar o negativo do carimbo e utilizar ambos, de um lado e de outro da folha, para a impressão do desenho, fazendo com que o stamping fique mais acentuado. A qualidade dependerá da maestria e da criatividade do profissional.
Em muitas peças de joalheria antigas, que contam com até 7 mil anos de idade, foi utilizada a técnica do stamping que, inicialmente a olhos leigos, poder-se-ia pensar que fosse a técnica do repoussé.